O primeiro e único encontro entre franceses e argelinos

O dia 6 de outubro de 2001 tinha tudo para ficar marcado como a data em que o esporte uniu franceses e argelinos. Quase 40 anos antes, os dois países travaram uma dura e sangrenta guerra, que culminou na independência da Argélia, em 1962. Já no século XXI, o evento futebolístico que tinha o intuito de selar a paz entre as duas nações seria um amistoso no Stade de France.

As duas seleções nunca haviam se enfrentado em uma partida de futebol. Em setembro de 1975 chegou a ser disputado um amistoso, mas sem os times principais e sequer entrou para a contagem oficial das duas federações. O primeiro registro mesmo foi naquela marcante noite de 2001.

Apesar do momento de paz que rodeava a partida, os dois times olhavam mais adiante. A França havia acabado de conquistar os últimos três torneios que disputou (Copa do Mundo, Eurocopa e Copa das Confederações) e o Mundial de 2002 era o foco maior. A Argélia, que mesmo sendo uma nação mais jovem já tinha duas Copas disputadas e um troféu da Copa Africana de Nações em 1990, olhava fixo para o torneio continental, que começaria em janeiro seguinte.

Tensão inicial

O amistoso ficou o tempo todo sendo tratado como “jogo da integração”. Só que esse clima mais ameno se foi logo na execução dos hinos nacionais. A famosa Marselhesa, hino nacional francês, foi muito vaiado pelos argelinos, ação tratada quase como uma afronta pelos torcedores e também dirigentes locais. Jacques Chirac, presidente francês na época, tratou o episódio como “inadmissível e inaceitável”.

Os jogadores franceses trataram de responder da melhor maneira possível: na bola, jogando futebol. Em 40 minutos, abriram 3 a 0. O primeiro gol saiu aos 18 minutos, com Candela. Mais tarde, aos 32, Emmanuel Petit invadiu a área argelina e chutou cruzado para ampliar. Já aos 40, Thierry Henry completou assistência de Trezeguet e ampliou a contagem. A Argélia chegou a descontar com Belmadi, de falta, ainda no 1º tempo, mas Robert Pirès fez o quarto gol francês aos 11 da etapa final.

Ah, antes que me esqueça, Zinedine Zidane jogou naquela noite. De ascendência argelina, ele era muito visado e um dos poupados pela torcida visitante, mas teve participação absolutamente discreta.

Caos instaurado

Faltavam 15 minutos para a partida acabar e as duas seleções esperavam o fim do amistoso. A França já havia feito quatro substituições e a Argélia três. Só que em pleno ataque argelino, o caos se instaurou. Um torcedor invadiu o gramado do Stade de France com a bandeira da Argélia e os seguranças demoraram para agir. Quando todos se deparam, mais pessoas invadiram o campo e o local que presenciou a final da Copa de 1998 virou palco de uma correria insana.

Poucos minutos depois da invasão, o árbitro português Paulo Manuel Gomes Costa, aparentemente convencido pelo técnico Roger Lemerre, decidiu encerrar a partida. Aí a situação saiu de controle. Mais torcedores tomaram o gramado e os jogadores precisaram correr às pressas para o vestiário. Imagens da TV flagraram, inclusive, Lilian Thuram discutindo rispidamente com um torcedor, sendo contido por um segurança e por Lemerre.

“Fiquei tão furioso que algumas pessoas estragaram um jogo tão importante. Foi importante pelo que aconteceu recentemente e pelas esperanças de que nossos países pudessem se aproximar, mas ele (o torcedor), como os outros, estragou tudo”, disse Thuram ao L’Equipe após o jogo.

Curiosamente, o cenário contrastava com o ambiente vividos pelas duas seleções. Jogo limpo dentro de campo e fora também, com jogadores argelinos parando para bater fotos e pegar autógrafos de Zidane no acesso aos vestiários.

O estrago só não foi pior porque a segurança conseguiu conter os torcedores ainda dentro do estádio. Nos arredores do Stade de France, tudo controlado. Ficou apenas a imagem negativa deixada pelo confronto. Franceses e argelinos esboçaram esse estreitamento da relação através do futebol em 2001, mas o primeiro e único jogo entre as duas seleções sequer terminou. Uma nota triste de uma história que já derramou muito sangue ao longo dos tempos.

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