Estar entre os melhores times da Europa é uma meta de dez entre dez clubes do Velho Continente, especialmente quando não se encontra obstáculos em solo local. É assim com o Paris Saint-Germain nos tempos atuais e foi da mesma maneira com o Lyon na primeira década do século XXI. Heptacampeões franceses, os Gones queriam dar esse salto no continente. O ápice dessa história foi em 2005, quando o OL bateu na porta da semifinal da Liga dos Campeões, mas teve o sonho surrupiado por um grotesco erro de arbitragem que até hoje traz terríveis lembranças.
Na temporada 2004/2005, talvez falássemos do melhor Lyon da história, com jogadores no auge, como o goleiro Grégory Coupet e os zagueiros Cris e Caçapa, outros em curva ascendente na carreira, como Michael Essien, Mahamadou Diarra e Florent Malouda, além de jovens promessas, como Hatem Ben Arfa e o brasileiro Nilmar, contratado naquele ano. Todos sob a maestria de Juninho Pernambucano, cada vez mais identificado com o clube.
A campanha até a fase de quartas de final foi sublime, sendo líder em sua chave na fase de grupos, ficando a frente, inclusive, do Manchester United, de Ryan Giggs, Ruud van Nistelrooy e de um jovenzinho Cristiano Ronaldo. Nas oitavas, fez história ao atropelar o Werder Bremen: 3 a 0 na ida, na Alemanha, e um massacrante 7 a 2 no Gerland para fechar um inigualável 10 a 2 no placar agregado.
No caminho até as semifinais estava o bom PSV Eindhoven. Sob a batuta de Guus Hiddink, o time que mostrou para a Europa jogadores como Mark van Bommel, Park Ji-Sung, além dos brasileiros Gomes e Alex, avançou em 2º no Grupo E, atrás apenas do então campeão inglês Arsenal. Na primeira etapa eliminatória, passou sem sustos por um velho conhecido do Lyon: o Monaco. Vitórias por 1 a 0 na Holanda e 2 a 0 no Principado.
Curiosamente, o encontro entre franceses e holandeses seria o menos midiático entre todos das quartas. Nas outras pontas estavam duelos poderosos, como entre Liverpool e Juventus e o clássico Milan e Inter. Havia também o encontro entre o já milionário Chelsea contra o tradicional Bayern. Apesar disso, nada tirava a atratividade de um duelo entre dois times azarões, mas que possuíam enormes virtudes.
O erro fatal
O equilíbrio acabou sendo a marca do confronto. Tanto na ida, no Gerland, quanto na volta, no Estádio Phillips, o Lyon abriu a contagem antes dos 15 minutos e cedeu o empate na etapa final. Na França foi Malouda quem anotou o primeiro gol, já na Holanda o autor do tento foi Wiltord. Cocu e Alex marcaram pros holandeses, respectivamente.
Placares iguais nos dois jogos. Hora da prorrogação. Com Chelsea, Liverpool e Milan classificados, a atenção se voltou por completo para a Holanda e Nilmar teve sua chance de ouro aos cinco minutos do tempo extra. Com duas alterações ainda disponíveis, Paul Le Guen olhou para o brasileiro no banco de reservas e viu ali a chance de tentar a vitória. Veloz, habilidoso e com faro de gol, o jovem de apenas 19 anos carregava quatro tentos em nove jogos naquela edição da Liga dos Campeões.
Quatro minutos depois de pisar no molhado gramado, Nilmar foi protagonista de um lance que não saiu da memória dos torcedores do Lyon até hoje. Coupet tinha a bola em mãos e despachou para o ataque, Malouda escorou de cabeça e deixou o brasileiro em condições de invadir a grande área em velocidade, pela direita. Num ato decidido em questão de segundos, Gomes saiu desesperado do gol. Ele se atirou nas pernas de Nilmar e o derrubou na área fatal.
Pênalti claro, cristalino, escandaloso, indiscutível… Menos para Kim Milton Nielsen. O árbitro dinamarquês, que tinha apitado a final da última Liga dos Campeões entre Monaco e Porto, simplesmente ignorou o lance. Ele não cedeu nem mesmo as reclamações efusivas de Juninho, que com as mãos juntas pedia a marcação da penalidade. Um erro inacreditável, ainda mais por se tratar de um apitador bastante respeitado na Europa.
Por uma ironia do destino, o jogo acabou sendo decidido na marca fatal. Não no lance em que era de direito ao Lyon, mas da disputa por pênaltis após a manutenção do 1 a 1. Juninho, que era o cobrador oficial do OL converteu o arremate, mas Abidal e Essien não. Melhor para o PSV, que foi até a semifinal vencendo por 4 a 2.
Um duro golpe que não foi cicatrizado. Após o jogo, Jean-Michel Aulas, presidente do Lyon, não poupou críticas e insinuações. Disse, inclusive, que viu dirigentes do PSV saindo do vestiário de Nielsen quando chegou ao estádio. Dentro das quatro linhas, a dor foi profunda até para quem não jogou, como Jérémy Berthod. Anos depois, quando se aposentou, o lateral que estava na reserva disse que não carregava nenhuma mágoa na carreira… exceto aquele pênalti não marcado. O próprio Juninho mostrou muita indignação na saída do gramado, balançando a cabeça negativamente de maneira insistente.
Ele e todo o time sabiam: aquele era o momento, aquela era a hora de se colocar entre os maiorais. E tão grande quanto seria aquele feito, foi o erro de Kim Milton Nielsen que acabou com todos os sonhos do Lyon.